Por dois anos, três meses e dois dias, ele transformou o
pavilhão 09 do Conjunto Penal de Feira de Santana na sucursal da maior facção
da América do Sul. A liderança absoluta na Bahia do Primeiro Comando da Capital
(PCC), o traficante Aderley Aires Santos, o Sniper, chegou ao conjunto penal no
dia 11 de janeiro de 2016 para cumprir pena por homicídio e, desde então, era
soberano na unidade. No entanto, desde o dia 13 deste mês, o criminoso está de
cela nova: foi transferido para a Penitenciária Federal de Catanduvas (PR), uma
das unidades de segurança máxima no país.
Como há um plano de expansão do PCC na Bahia, o estado é
prioridade logística e estratégica, a transferência de Aderley foi estendida
para outros oitos presos ligados à facção – no mesmo dia 13,22 integrantes da
organização criminosa no país foram encaminhados para unidades federais de
segurança máxima, entres eles o líder máximo da facção, Marcos Willians Herbas
Camacho, o Marcola.
Aderley desempenha função de “Sintonia Final do Estado”, ou
“Geral do Estado” ou “Torre” do PCC na Bahia. É a posição máxima na hierarquia
da facção nos estados (exceto São Paulo) e a segunda na hierarquia nacional.
Somente se subordina aos integrantes da “Sintonia Final dos Fundadores”,
restrito grupo de criminosos (todos paulistas), a maior parte presente na
organização criminosa desde a fundação em 1993.
Ele já esteve preso no Centro de Detenção Provisória de Mauá
(SP), onde, segundo consta na decisão de transferência, “é provável que tenha
sido ‘batizado’ pelo PCC e aderido ao estatuto dessa organização criminosa”.
Laércio dos Santos Machado, o Nego Lama, braço direito
de Aderley, também foi transferido do Conjunto Penal de Feira de Santana para
Catanduvas. Ele é a segunda posição na hierarquia estadual do PCC e somente se
subordina, no âmbito da sucursal baiana, ao líder máximo local, e é responsável
pelas operações do PCC dentro das unidades prisionais.
Já outros sete internos ligados à organização criminosa e
que estavam no conjunto penal foram encaminhados para o Presídio de Serrinha,
considerada a unidade de segurança máxima do estado. São eles: Diogo Silva de Amorim,
Edson Barreto Soares, Adilson da Conceição Ramos, Cleber Brito de Souza,
Cipriano Bernardo de Jesus, João José dos Santos Filho e Sandson Santos
Carvalho.
O CORREIO teve acesso, com exclusividade, à decisão da
transferência de Aderley determinada pelo Tribunal de Justiça do Estado da
Bahia (TJ-BA) – o documento é assinado pelo até então juiz da Comarca de Feira
de Santana Waldir Viana Ribeiro Júnior, no dia 13 de novembro de 2018. A
intenção do Ministério Público Estadual (MP-BA), autor do pedido, era
encaminhar o traficante para o Presídio de Serrinha. Mas, diante da
periculosidade do preso, aliada à vulnerabilidade da unidade de segurança
máxima, o juiz decidiu transferir a liderança do PCC na Bahia para Catanduvas.
O magistrado explica a retirada do traficante do estado. O
motivo é a execução de “um plano de expansão da organização criminosa paulista
PCC, com a finalidade de assumir diretamente o controle do crime organizado na
Bahia, sobretudo o comércio de entorpecentes, passando por crimes contra
instituições bancárias e até mesmo agências da Empresa Brasileira de Correios e
Telégrafos”, diz trecho da decisão.
Tarefas
O PCC estruturou um núcleo administrativo descentralizado que reúne, em
território baiano, a gestão de todos os recursos materiais e pessoais. Tal
célula é responsável por angariar novos integrantes para facção, ampliar os
territórios de exclusividade no comércio de entorpecentes, manter registros
comerciais e contábeis de seus recursos financeiros e coordenar as operações
criminosas, além de manter os necessários relacionamentos com outras
organizações criminosas locais.
O documento aponta que o núcleo baiano do PCC, segundo as
investigações do Grupo de Ações de Combate as Organizações Criminosas (Gaeco)
do MP-BA, está instalado dentro do Conjunto Penal de Feira de Santana, nos
pavilhões 02 e 09 (principalmente) – tendo na cela 02 deste último o
denominado “quadrado” ou “Barraco do Spot da Família”, onde Aderley, auxiliado
pelo primeiro escalão da organização na Bahia, administrava, através de
videoconferências com o uso de celulares, todas as atividades da sucursal local
da facção paulista.
A transferência dos presos que estavam no Conjunto Penal de
Feira de Santana fez parte da Operação Spot, deflagrada por meio do Gaeco, da
Unidade de Execução da Pena (Umep) e da 3ª Promotoria de Justiça de Feira de
Santana, em conjunto com as Secretarias de Administração Penitenciária e
Ressocialização (Seap) e de Segurança Pública (SSP).
Controle
Ainda na decisão da transferência de Aderley, o então juiz da Comarca de Feira
de Santana Waldir Viana Ribeiro Júnior disse que o PCC busca atualmente
adquirir o controle do crime organizado em todo o território nacional,
concentrando desde o domínio sobre as rotas de tráfico internacional de drogas,
até os pontos de venda direta dos entorpecentes aos usuários, tendo a Bahia
como prioridade logística e estratégica.
Para o professor César Barreira, titular da Universidade
Federal do Ceará (UFC) e coordenador do Laboratório de Estudo da Violência
(LEV) da UFC, alguns fatores fazem com que a facção tenha interesses em se
estabelecer no estado. “A Bahia é um estado muito populoso, com o índice alto
de violência. Sem falar que Salvador é a terceira capital do país, tem um
mercado consumidor alto. Tudo leva a crer para um cenário deste”,
declarou César Barreira.
Ele faz um alerta à expansão do PCC no Nordeste. “Todos
esses estados, principalmente os maiores, como Bahia e Ceará, o PCC está
querendo ampliar o monopólio como em São Paulo. A grande meta são os estados
maiores que têm como predominância mais uma facção, mas que não são tão
organizadas. Na Bahia e Ceará, essas facções não são tão fortes em relação à
hierarquia, às disciplinas e, por isso, é muito fácil a entrada externa de
grupos criminosos, como o PCC", afirma o professor.
Ele fez um alerta à possível represália da facção na Bahia
por conta das nove transferências. “Todas essas ações são medidas do Estado.
Nesse caso da Bahia, pode acontecer o que já está acontecendo em outras partes
do país. Cabe ao estado manter firmes as medidas adotadas. A tendência é haver
uma ação”, pontuou o professor.
Desde o início do ano, o Ceará vem enfrentando um cenário de
caos após reação de facções criminosas, entre elas o PCC. O estado já registrou
mais de 150 ataques, entre incêndios, tiros contra prédios públicos e
bancos e explosões de dinamite na base de um viaduto. A reação surgiu após
o governo local adotar mais rigor contra a entrada de celulares nos presídios.
Respostas
O CORREIO procurou a Secretaria de Segurança Púbica (SSP) para comentar sobre a
transferência dos nove presos. Por meio de nota, a SSP informou que "não
divulga informações sobre operações que envolvem transferências de detentos e
movimentação de quadrilhas, por entender que a publicidade dessas ações pode
gerar prejuízos às investigações, além de gerar riscos desnecessários à rede
de segurança pública”.
Em relação às transferências, o Ministério Público do Estado
da Bahia (MP-BA) limitou-se a informar que os promotores do Gaeco “concederão
entrevistas”.
Sobre as críticas feitas pelo juiz Waldir Viana, a
Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização (Seap) informou por
meio de nota que o “Conjunto Penal de Serrinha preenche todos os requisitos de
uma unidade de segurança máxima, conforme orientações do Departamento
Penitenciário Nacional. A Seap, nos últimos anos, empenhou esforços para
ampliar o sistema prisional colocando a Bahia com uma das melhores proporções
vagas x presos do país. E a unidade de Serrinha foi uma delas, visando um
estabelecimento Penal de Segurança Máxima”.
“Embora as transferências de presos para outras unidades, dentro ou fora do Estado, sejam determinações da justiça, a Seap conta com o apoio de todo o Sistema de Defesa Social e da Inteligência do Sistema Prisional para analisar cada solicitação de transferência”, diz outro trecho da nota.
A Seap disse ainda que “por questões de segurança, o Conjunto Penal de Serrinha com capacidade para 476 presos, contém 174 internos e somente são encaminhados para esta unidade presos em Regime Disciplinar Diferenciado, conforme Lei de Execução Penal nº 10.792/03, Art. 52, §2º”.
“Embora as transferências de presos para outras unidades, dentro ou fora do Estado, sejam determinações da justiça, a Seap conta com o apoio de todo o Sistema de Defesa Social e da Inteligência do Sistema Prisional para analisar cada solicitação de transferência”, diz outro trecho da nota.
A Seap disse ainda que “por questões de segurança, o Conjunto Penal de Serrinha com capacidade para 476 presos, contém 174 internos e somente são encaminhados para esta unidade presos em Regime Disciplinar Diferenciado, conforme Lei de Execução Penal nº 10.792/03, Art. 52, §2º”.
FONTE: Jornal CORREIO, com imagem reprodução.
Nenhum comentário:
Postar um comentário